sábado, 27 de novembro de 2010

A Narrativa de R.Nascimento ou Tropa de Elite 2,um conceito literário para o cinema.

   "Sei que parece cliché de filme americano, mas é na hora da morte que a gente entende a vida.Já mandei muito vagabundo pra vala, político pra cadeia, mas não era nada pessoal. Missão dada é missão cumprida" (Cel. R.Nascimento)

    Verdadeiramente, não faltam adjetivos para expressar o que sentimos diante do filme Tropa de Elite 2. Juro que não me contento em dizer que o filme é: "forte", "emocionante","um  tapa na cara","legal", "bacana" e patati-patatá!  Eu sei que é  um desafio quando se fala de voz narrativa no cinema, mas vamos falar aqui, sim.

   A narrativa de R.Nascimento, tão casmurro quanto Bentinho, na sua sala no Engenho Novo, me leva a pensar a relação entre as palavras e as imagens em movimento.
   R.Nascimento é o personagem narrador, é ele quem conta sua história para nós os espectadores. A narrativa é toda marcada pelo seu olhar e há um entrelaçamento entre o narrador e a forma por meio da qual ele transmite suas experiências que repousam no nível mais profundo de sua alma. R.Nascimento não narra sua história para falar apenas da  policia, da corrupção,das milícias e da politica, há  que se narrar por meio de uma  linguagem tensa, intempestiva, mas literária, poética, cômica, dramática e sedutora. E assim, ele discute também sobre a natureza de um tempo, no qual o passado aflige a sua mente com as lembranças, o presente é torturante, o futuro não promete trazer mudanças. Por isso, ele narra num crescente desespero, empilhando metáfora sobre metáfora para descrever o seu "estado de alma", formas de sofrimento, opressões e desapontamentos.
   Embora o Roberto Nascimento seja um personagem de ficção muitas das caractristicas que atribuímos a ele são, igualmente, presentes em todos nós espectadores. Creio que para entendermos  a história do "olhar" deste narrador personagem, há que se entender que o olhar dele é o nosso olhar.
   Sabem porque nos interessa entender o olhar do personagem narrador? Não? É que não é ele sozinho quem entendeu que "o inimigo agora é outro" são  policiais, são políticos com interesses eleitoreiros, não só os traficantes de drogas. Nesse momento de retorno ao passado, não são apenas imagens que surgem à mente do narrador, são palavras, reflexões de conceitos.

   Sabe-se que o processo de rememoração se carecteriza pelo movimento de relembrar o passado visando a mudança do presente, ou simplesmente um movimento de volta ao passado numa tentativa de compreender o incompreensível. Afinal, o Tropa de Elite 2  não é um romance, é um filme, e a criação de uma obra cinematográfica utiliza outros recursos: humanos, técnicos e artísticos. No cinema, a câmera atua como amplificadora das imagens, de modo que ela revela o mundo em outra escala e desnuda a vida secreta que se tece a nossa volta  e em nós.Ai, a máquina inteligentemente, surge como um elemento demoníaco cujo horizonte é a exploração do universo marginal da policia, dos políticos  e dos traficantes.

   Não podemos e não devemos esquecer, também, a presença da intertextualidade no Tropa de Elite 2, ela alcança a tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca de William Shakespeare, e uma das mais famosas frases da literatura universal, "Ser ou não ser, eis a questão" é ai  apresentada ,cinicamente, pela corja de matadores profissionais diante do crânio da jornalista barbaramente assassinada.

   Enfim, o libelo acusatório de R.Nascimento vai tramitar no nosso imaginário até a punição dos culpados ou... Enquanto isso, vamos sonhando com a Utopia, aquela ilha de Thomas Morus, que é uma sociedade perfeita. A ilha de Utopia, abarca a sociedade ideal , inatingível que traduz um  estado de bem estar aos seres humanos.

Essa é uma obra de ficção?  Sim! mas qualquer semelhança é mera coincidência! Não esqueçam.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

1. João Cabral de Melo Neto, um autor pós-modernista

João Cabral  é para a poesia o que Guimarães Rosa foi para a prosa: ambos são considerados os mais representativos da geração de 45, revelam uma sintaxe ou uma linguagem trabalhada que chega ao requinte formal, mas na origem dessa linguagem arquitetada está o discurso do homem simples, do homem do sertão. Ambos partem da linguagem oral acrescentando a ela seus conhecimentos profundos da língua portuguesa.
O próprio Joaõ Cabral declarou que, para ele, " inspiração não funciona" isto é, sua poesia  não é escrita para falar de suas emoções  ou  para dizer da beleza dos atos. Ela é o resultado de um intenso trabalho formal, em que o poeta  reelabora o texto até atingir a forma que ele julga adequada. E eu considero o seu poema  Catar Feijão  um texto  bem representativo do seu estilo, da sua postura.  O trabalho poético de Joaõ Cabral é,  sem sombra de dúvida,  um trabalho metalinguistico. E disso é que resulta o lirismo de Joaõ  Cabral, é o lirismo que advém da luta  entre o homem e as palavras, do homem contra o individualismo romântico: poesia sobre os dados objetivos da  realidade, com uma linguagem que é arquitetada, elaborada para ser precisa, denotativa.

Catar Feijão
Catar feijão se limita com escrever:
joga-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo;
pois para catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e o oco; palha e eco.
Ora, nesse catar feijão entra um risco;
o de que entre os grãos pesados entre um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar  palavras:
a pedra dá a frase grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a com o risco.


Bela analogia! ele, João Cabral , consegue fazer. Quem já catou feijão sabe como é,  e quem precisa  escrever um texto também sabe da angústia pela escolha e  procura da palavra precisa ,  adequada, aquela palavra  que vai  representar o  pensamento.


In.João Cabral de Melo Neto,
Antologia Poética.Rio de Janeiro,Ed.Sabiá,1967.p.16

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Um escritor latino-americano

Mário Vargas Llosa
O Mário Vargas Llosa ganhou o Premio Nobel de Literatura 2010.Recentemente ele esteve aqui no Brasil e participou do evento Fronteiras do Pensamento, em Porto Alegre. A entrevista que ele concedeu a Revista Veja de 20 de outubro  foi uma " senhora entrevista.". Confessou o tanto quanto  ficou surpreso com uma ligação às 5.30 da manhã, com a noticia de que tinham lhe dado o Premio Nobel! e ai sua vida  virou um pandemônio! Bendito pandemônio, digo eu.! Faz muito tempo que eu li Conversa da Catedral e a Guerra do Fim do Mundo. Confesso que devo ler outra vez, os dois...
Dentre as perguntas que a Veja fez ao Mario Vargas  Llosa uma me fez  pensar e repensar! muito mais do que as outras. La vai a desencadeadora dos pensares...

"Como é para  um escritor, o esforço de se comunicar com as massas?
Terrível. A linguagem é preciosa para o escritor.Quando você está submerso nas massas, há muita pressão para rebaixar a fala, de forma a ser entendida pelo maior número possivel de pessoas. É preciso repetir e simplificar, simplifiar e repetir. no final, acabava traindo a mim mesmo e ao que há de mais sagrado para o trabalho de escritor.
Quando se tem que fazer cinco discursos por dia, não há como evitar cair nos clichês e na linguagem morta do politico profissional"

Mario, atualmente, é professor convidado da Universidade Princeton, nos Estados Unidos. Sua obra critica a hierarquia de castas sociais e raciais, vigentes, ainda hoje, no Perú e na América Latina.

Eu confesso que concordo com o o mesmo pensamento  sobre a linguagem. Simplificar e repetir, repetir e simplificar até o fim, até que se esvaia toda a tentativa de representação do pensamento que ela possa conter? é doloroso!